Na última sexta-feira (12) por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou o entendimento de que a tese da legítima defesa em casos de feminicídio é inconstitucional, por violar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. Na ação, o Partido Democrático Trabalhista (PDT) argumenta que há decisões de Tribunais de Justiça que ora validam, ora anulam vereditos do Tribunal do Júri em que se absolvem réus processados pela prática de feminicídio com fundamento na tese.
Segundo Toffoli, além de ser um argumento “atécnico e extrajurídico”, a tese é um “estratagema cruel, subversivo da dignidade da pessoa humana e dos direitos à igualdade e à vida” e totalmente discriminatório contra a mulher. A seu ver, trata-se de um recurso argumentativo e retórico “odioso, desumano e cruel” utilizado pelas defesas de acusados de feminicídio ou agressões contra mulher para imputar às vítimas a causa de suas próprias mortes ou lesões, contribuindo para a naturalização e a perpetuação da cultura de violência contra as mulheres no Brasil.
Ao ressaltar que o argumento não é, tecnicamente, legítima defesa (essa, sim, causa de excludente de ilicitude), o ministro registrou que, para evitar que a autoridade judiciária absolva o agente que agiu movido por ciúme, por exemplo, foi inserida no Código Penal a regra do artigo 28 de que a emoção ou a paixão não excluem a imputabilidade penal. “Portanto, aquele que pratica feminicídio ou usa de violência, com a justificativa de reprimir um adultério, não está a se defender, mas a atacar uma mulher de forma, desproporcional, covarde e criminosa”, afirmou.
Para o ministro Alexandre de Moraes, o Estado não pode permanecer omisso perante a naturalização da violência contra a mulher, sob pena de ofensa ao princípio da vedação da proteção insuficiente e do descumprimento ao compromisso adotado pelo Brasil de coibir a violência no âmbito das relações familiares. A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, afirmou que a tese não tem amparo legal e foi construída como forma de adequar práticas de violência e morte “à tolerância vívida”, na sociedade, aos assassinatos de mulheres tidas por adúlteras ou com comportamento que destoe do desejado pelo matador. Já o ministro Gilmar Mendes ressaltou que a tese é pautada “por ranços machistas e patriarcais, que fomentam um ciclo de violência de gênero na sociedade”.
Também acompanharam integralmente o relator a ministra Rosa Weber e os ministros Marco Aurélio, Nunes Marques e Ricardo Lewandowski.