Estudo realizado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) aponta que avaliar a composição corporal de pessoas com mais de 65 anos pode ser uma estratégia eficaz para estimar a longevidade, sobretudo por meio da análise da massa muscular localizada em braços e pernas (apendicular).
Depois de acompanhar um grupo de 839 idosos durante cerca de quatro anos, os cientistas observaram que o risco de mortalidade geral durante o período foi quase 63 vezes maior entre as mulheres com pouca massa muscular apendicular.
Apoio
Entre os homens que já na primeira avaliação apresentavam baixa porcentagem de músculos nos membros, a chance de morrer foi 11,4 vezes maior. Os resultados da pesquisa, apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foram divulgados no Journal of Bone and Mineral Research.
“Avaliamos a composição corporal da nossa população, com ênfase na massa muscular apendicular, gordura subcutânea e gordura visceral. Em seguida, buscamos identificar quais desses fatores poderiam predizer a mortalidade nos anos seguintes. A quantidade de massa magra nos membros superiores e inferiores foi o que mais se destacou na análise”, disse à Agência Fapesp Rosa Maria Rodrigues Pereira, professora da disciplina de Reumatologia na Faculdade de Medicina e coordenadora da pesquisa.
“O apoio de agências de fomento, como a Fapesp, é fundamental, pois o financiamento representa um grande desafio. O trabalho, que começou em 2005, trouxe respostas a várias perguntas que fazíamos há mais de dez anos, com um retorno para o País e a valorização para a pesquisa nacional”, acrescenta a docente.
Os voluntários foram examinados por uma técnica conhecida como densitometria por emissão de raios X de dupla energia (DXA, na sigla em inglês). O equipamento foi adquirido com auxílio da Fapesp, durante um projeto anterior coordenado pela docente, para avaliar a prevalência de osteoporose e de fraturas em idosos residentes no Butantã, na zona oeste da capital paulista.
Em ambos os projetos foi estudada a mesma população, acima de 65 anos. “Selecionamos os voluntários com base nos dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Trata-se de uma amostra representativa da população de idosos do Brasil”, ressaltou a docente.
Na análise final, foram incluídos 323 (39%) homens e 516 mulheres (61%). A frequência de baixa massa muscular nessa amostra foi em torno de 20% em ambos os sexos.
Condição
A perda generalizada e progressiva de massa muscular associada ao envelhecimento é conhecida como “sarcopenia”. Dados da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia indicam que a condição chega a afetar 46% dos indivíduos acima de 80 anos.
Principalmente quando combinada à osteoporose, a sarcopenia pode aumentar a vulnerabilidade dos idosos, tornando-os mais propensos a quedas, fraturas e outros traumas físicos.
“Pelos critérios mais usados, a maioria dos indivíduos identificados como sarcopênicos é magra. Como a população que estudamos apresentava, em média, um índice de massa corporal mais elevado, ajustamos o cálculo da massa muscular de acordo com a gordura corporal dos voluntários. Aqueles que apresentavam um índice de massa muscular 20% abaixo da média foram classificados como sarcopênicos”, explicou Rosa Maria Rodrigues Pereira.
Além do exame de densitometria, também foram realizadas análises de sangue e aplicados questionários para avaliação da dieta, grau de atividade física, consumo de tabaco e álcool e presença de doenças crônicas, como diabetes, hipertensão e dislipidemia.
Após quatro anos de seguimento, 15,8% (132) dos voluntários haviam morrido. Desses, 43,2% por problemas cardiovasculares. O índice de óbito entre os homens foi de 20%, enquanto entre as mulheres foi de 13%.
Diferenças
De modo geral, os indivíduos que morreram eram mais velhos, faziam menos atividade física, sofriam mais de diabetes e de problemas cardiovasculares. Além disso, no caso das mulheres, apresentam um IMC mais baixo.
No caso dos homens, eles apresentavam maior chance de sofrer quedas. Todas essas variáveis foram acrescentadas no modelo estatístico e ajustadas para o resultado, que indicaria qual fator da composição corporal estaria associado com o risco de morte.
No caso das mulheres, consideradas as variáveis de ajuste, apenas o índice de massa muscular baixo se mostrou significativo. Já entre os homens, a gordura visceral também foi um fator relevante.
A chance de morrer tornava-se duas vezes maior a cada aumento de seis centímetros quadrados na adiposidade abdominal. Curiosamente, um índice mais alto de gordura subcutânea teve efeito protetor para os homens estudados.
“Observamos que nos homens outros parâmetros também influenciaram negativamente a mortalidade, diminuindo do ponto de vista estatístico o peso da massa muscular apendicular. Nas mulheres, por outro lado, a massa muscular se destacou de forma isolada e, por esse motivo, teve maior influência”, salientou a docente.
Exercícios
A boa notícia é que a sarcopenia é um problema que pode ser evitado e até mesmo revertido com a prática de exercícios físicos, principalmente musculação. Cuidados com a ingestão de proteínas também são recomendados.
“É muito importante tentar orientar os pacientes quanto à massa muscular, sobretudo com medidas preventivas como musculação, atividade física e dieta com proteínas”, avalia a professora Rosa Maria Rodrigues Pereira.
O artigo Association of Appendicular Lean Mass, and Subcutaneous and Visceral Adipose Tissue With Mortality in Older Brazilians: The São Paulo Ageing & Health Study, de Felipe M. de Santana, Diogo S. Domiciano, Michel A. Gonçalves, Luana G. Machado, Camille P. Figueiredo, Jaqueline B. Lopes, Valéria F. Caparbo, Liliam Takayama, Paulo R. Menezes e Rosa M. R. Pereira, pode ser acessado pela internet.