Cidadania, um nome simples e de fácil entendimento, mas de difícil compreensão e quase impossível de exercer nos dias de hoje.
Do dicionário: cidadania -substantivo feminino- qualidade ou condição de cidadão ou condição de pessoa que, como membro de um Estado, se acha no gozo de direitos que lhe permitem participar da vida política.
E por que o título desta coluna?? Desde o início da ‘corrida’ pela Presidência da República, antes mesmo da campanha política ser oficial, observamos (eu atônita) a intolerância das pessoas com o pensamento das outras, com a escolha das outras, com os questionamentos das outras.
Não se pode falar sobre política e político. Cada um tem seu grande ‘salvador da pátria’ definido e o grande vilão definido também. A relação de amor e ódio com esses personagens é permeada pela decisão em não ver, não ouvir, não querer saber o que o outro pensa, recusando-se a uma conversa assertiva e permeada por argumentos coerentes.
Todo mundo correto, com seu candidato correto, o melhor candidato! O único capaz de resolver os problemas do País. Ninguém escutando o outro, ninguém buscando os erros do seu candidato, as incoerências dele. Recusando-se a escutar um questionamento sobre o mesmo. Tanta gente escolhendo ‘o melhor candidato de todos’ e votando nele, que chego a pensar que só temos perfeições na política… Fato que torna estranho estarmos nesta condição em que nos encontramos hoje em dia: economia estagnada, desemprego record, casos de corrupção que nos chocam, violência e criminalidade gigantescas, saúde pública caótica, educação pedindo socorro… em resumo, País dando suspiros para sobreviver.
Fico aqui me perguntando: Por que será? Onde erramos? Será que erramos ao elegermos salvadores, homens perfeitos, ‘vestirmos a camisa’ do homem e não das propostas que vem dele e de suas idéias. Será que erramos ao não estudarmos o passado do candidato, sua vida pública pregressa para buscarmos compreender se o que diz, condiz e anda de acordo com o que promete?
Lendo “É proibido calar! Precisamos falar de ética e cidadania com nossos filhos.”, de Mílton Jung, ainda no começo do mesmo, deparei-me com um capítulo que me levou à reflexão. Capítulo 2 – Pouca coisa não é. Nele, o autor, de forma leve, divertida, utilizando-se de linguagem fácil e próxima de nosso dia a dia conta sobre como falou sobre patriotismo com seu filho, ainda pequeno à época, utilizando-se de um recorte de jornal ‘esquecido’ na geladeira. Recorte da época de Collor e do escândalo de corrupção que levou ao primeiro impeachment de nossa história.
No pedaço de jornal havia um pequeno diálogo:
“- E tudo isso apenas movido pelo patriotismo?
– E o senhor acha pouco?” (p.23)
Tratava-se da pergunta de Roberto Jefferson para Eriberto França, que denunciou o esquema de corrupção do governo chegando até a famosa compra do Fiat Elba (estopim do processo contra Collor). O pai (Mílton Jung) conversa com o filho sobre o que significou tudo aquilo e quão importante foi aquele posicionamento de Eriberto, a despeito de tudo o que viveu e sofreu de ‘punições’ e retaliações, por conta de seu depoimento.
Após a leitura do livro e observando nossa clara dificuldade em conversarmos sobre política, arrisco dizer, que é, em virtude disso que seguimos escolhendo errado!
Não conversamos e não exercemos nosso direito à cidadania. Ao invés de nos unirmos enquanto uma nação que busca crescimento e evolução, ‘aceitamos resignados’ brigarmos e nos desentendermos totalmente manipulados pelos candidatos que, evidentemente, ganham pontos com a separação do povo brasileiro, a divisão e a briga entre nós.
À medida em que não conversamos, não nos permitimos trocar ideias. Não nos permitirmos pensar juntos, cobrar enquanto uma única nação. Seguimos aceitando ser divididos entre ‘esquerdopatas’, ‘coxinhas’, ‘ricos’ e ‘pobres’. “Vamos destruir os ricos horríveis e lhes punir com muitos impostos, vamos dar tudo aos pobres”. Ouvimos isso e nem paramos para refletir que, às vezes, destruir o rico, pode impactar no mais pobre, pois este talvez fique sem emprego, pois o rico foi destruído. Sem renda, ‘ricos e pobres’ tornam-se reféns de uma situação desesperadora. O País não vê dinheiro circular. Falta dinheiro no mercado, tem-se o desespero total, desemprego aumenta, população cada vez mais necessitada de programas sociais, prejudicados pela falta de dinheiro, em virtude dos muitos casos de corrupção que nos atropelam dia após dia.
Precisamos conversar! Precisamos entender o que esperamos (enquanto nação) de nosso futuro governante. Precisamos ouvir suas idéias. Precisamos questionar. Precisamos desconfiar. Precisamos pesquisar.
Precisamos guardar as armas, as acusações, as brigas, as cutucadas, os xingamentos, porque todos temos o direito de termos opinião, preferência, expressarmos nossos pensamentos, sem sermos agredidos e ofendidos e sem ofender e agredir; também porque respeito é fundamental, como pontuou há muitos e muitos anos atrás Voltaire: “Posso discordar do que você diz, mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo.”, sim, exato, posso discordar de você, podemos ter opiniões opostas, mas não podemos te impedir de expressá-la. Muitas vezes, ouvir e conversar sobre essas diferenças de ideias nos faz crescer, nos faz resignificar muita coisa que pensávamos e faz isso com o outro também. Pode ser que continuemos com nossa opinião e o outro também, mas o importante é que o faremos de forma pacífica e ética.
Tudo isso pelo patriotismo! Sim, tudo isso para vermos nosso País parar de perder para Políticos que ganham com as separações do entre as pessoas, as brigas infinitas. Tudo isso pela cidadania (a nossa) e pelo reconhecimento ao direito do outro exercer sua cidadania.
Encerro com dois pensamentos que nos convidam a uma reflexão sobre a maneira como estamos exercendo nossa cidadania e sobre a maneira como estamos permitindo (ou não) que o outro a exerça:
1) “Para a política o homem é um meio; para a moral é um fim. A revolução do futuro será o triunfo da moral sobre a política.” Ernest Renan; e
2) “Eu quero desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram.
Recuperar sentidos.” Rubem Alves