Após aprovar o texto principal, em uma sessão marcada por confusões e protestos, os senadores concluíram há pouco a votação da reforma trabalhista. Enviado pelo governo e aprovado no Senado da mesma forma como veio da Câmara dos Deputados, o projeto de lei segue agora para sanção do presidente Michel Temer.
A proposta altera mais de 100 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), permitindo mudanças como a prevalência do acordado entre patrões e empregados sobre o legislado nas negociações trabalhistas. A sessão chegou a ser iniciada às 11h de hoje (11), mas as senadoras da oposição ocuparam a Mesa do Senado e impediram que o presidente da Casa, Eunício Oliveira, conduzisse os trabalhos, que foram retomados apenas no início da noite.
Por mais de sete horas, as parlamentares permaneceram no Plenário, mesmo com as luzes apagadas. Com críticas ao mérito da reforma e ao modo como ela seria apreciada, as senadoras da oposição rejeitaram por diversas vezes sugestões de acordo para que a votação fosse retomada.
De acordo com o senador Jorge Viana (PT-AC), as parlamentares tomaram uma atitude política e criticou o fato de o Senado não ter feito qualquer alteração para melhorar a proposta vinda da Câmara, abrindo mão do papel de casa revisora.
Após uma série de bate-bocas e tentativas de negociações, o presidente do Senado voltou ao Plenário no início da noite e, com um microfone sem fio, anunciou que retomaria o comando da sessão de qualquer jeito. Com duras críticas à posição das senadoras, Eunício Oliveira disse que sempre buscou cumprir os acordos, garantindo inclusive discussões da matéria para além das previsões regimentais. “Nem a ditadura militar ousou ocupar a Mesa do Congresso Nacional. Isso não existe no regime democrático”, reclamou.
Destaques
Com 50 votos favoráveis, 26 contrários e uma abstenção, o texto-base do projeto de lei foi aprovado por volta das 19h50, mas os senadores continuaram a discussão por mais duas horas e trinta minutos, enquanto analisavam três destaques que buscavam alterar pontos específicos do projeto. As sugestões buscavam excluir da reforma mudanças como a regulamentação do trabalho intermitente e a obrigação de que mulheres grávidas e lactantes apresentem atestado médico para que sejam afastadas de atividades insalubres.
Um dos destaques buscava derrubar a possibilidade do trabalho intermitente, que prevê a possibilidade de o empregador contratar e remunerar os trabalhadores apenas durante o tempo da prestação de serviços, excluindo períodos de inatividade. Outra proposta de mudança, também rejeitada pela maioria dos senadores, visava a manter a legislação trabalhista acima das convenções e acordos coletivos de trabalho.
Vetos
Para que a proposta não voltasse a ser analisada pela Câmara dos Deputados, os senadores governistas não aceitaram nenhuma mudança de mérito no texto e rejeitaram também as emendas apresentadas de modo individual. No entanto, como resposta aos pontos polêmicos da proposta, há um compromisso do presidente Michel Temer de vetar seis pontos da reforma. A ideia é aperfeiçoar esses pontos para que eles sejam reapresentados via medida provisória ou projeto de lei.
Um desses pontos é o que aborda o tratamento da gestante e do lactante em ambiente insalubre. O texto prevê que a trabalhadora gestante deverá ser afastada automaticamente, durante toda a gestação, apenas das atividades consideradas insalubres em grau máximo. Para atividades insalubres de graus médio ou mínimo, a trabalhadora só será afastada a pedido médico.
Em relação ao trabalho intermitente, o relator recomenda veto aos dispositivos que regulamentam a prática. Neste tipo de trabalho, são alternados períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. Segundo os relatores da matéria, o melhor seria regulamentar por medida provisória, estabelecendo os setores em que a modalidade pode ocorrer.
Mudanças
A proposta de reforma trabalhista prevê, além da supremacia do negociado sobre o legislado, o fim da assistência obrigatória do sindicato na extinção e na homologação do contrato de trabalho. Além disso, acaba com a contribuição sindical obrigatória de um dia de salário dos trabalhadores. Há também mudanças nas férias, que poderão ser parceladas em até três vezes no ano, além de novas regras para o trabalho remoto, também conhecido como home office. Para o patrão que não registrar o empregado, a multa foi elevada e pode chegar a R$ 3 mil. Atualmente, a multa é de um salário-mínimo regional.
Principais alterações aprovadas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
Item | Antes da reforma | Com a reforma |
---|---|---|
Acordado sobre legislado | A lei diz que pode haver negociação das condições de trabalho entre representantes dos trabalhadores e empresas, mas não diz quais. A Constituição tem artigos que servem de limite a essas negociações | Especifica quinze pontos em que a negociação coletiva, se houver, se sobrepõe à CLT (como jornada de trabalho, grau de insalubridade e registro de horas) e lista trinta que não podem ser mudados (como salário mínimo, direito a férias e licença-maternidade). Os limites presentes na Constituição permanecem válidos |
Férias | Pode ser dividida em até dois períodos sendo que um deles não pode ser menor que dez dias | Poderá ser divida em até três períodos, se houver concordância do empregado, sendo que um deles não pode ser menor que 14 dias |
Invervalo intrajornada (almoço) | De 1 hora, no mínimo, em jornadas com mais de 6 horas de duração | Poderá ser reduzido a até 30 minutos, se houver acordo coletivo, para jornadas com mais de 6 horas de duração |
Banco de horas | Deve ser compensado em até 1 ano, e negociado em acordo ou convenção coletiva | Deverá ser compensado em até 6 meses, e são permitidos acordos individuais |
Horas em deslocamento (in itinere) | O tempo em que o trabalhador está no transporte fornecido pela empresa é considerado como trabalho, se não houver transporte público disponível | Será apenas contado como tempo de trabalho o período a partir do qual o trabalhador estiver em seu posto de trabalho |
Contrato intermitente | Não existe | Será possível contratar trabalhadores sem carga horária fixa. O empregador deverá convocar o empregado com três dias de antecedência, e ele poderá recusar o trabalho. Se aceitar e faltar sem motivo justo, deve pagar multa de metade do valor que receberia |
Trabalho temporário | De até 25 horas, sem possibilidade de fazer hora extra e com férias entre 8 e 18 dias, dependendo da carga horária | Até 30 horas (sem possibilidade de hora extra) ou 26 horas (com hora extra). Férias iguais às dos trabalhadores em tempo integral |
Trabalho autônomo | O trabalho autônomo não pode ter características de exclusividade, eventualidade e subordinação. Senão, pode ser considerado pela Justiça como um vínculo trabalhista | Desde que haja um contrato formal, um trabalhador autônomo que preste serviço continuamente e com exclusividade não é considerado como empregado |
Acordo para demissão | Não há. Se o trabalhador se demitir ou for demitido por justa causa, não tem direito a sacar FGTS, seguro-desemprego e não recebe multa. Se for demitido sem justa causa, recebe multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, pode sacar o fundo e tem direito a seguro-desemprego | Além das regras anteriores, empregador e empregado podem chegar a acordo para demissão. Nesse caso, o trabalhador recebe multa de 20% do FGTS, pode movimentar até 80% do fundo e não tem direito a seguro-desemprego |
Contribuição sindical | É descontado obrigatoriamente no mês de março o equivalente a um dia de trabalho como contribuição sindical | Cada trabalhador deverá indicar se autoriza o débito da contribuição sindical |
Grávidas | Não podem trabalhar em ambientes insalubres | Poderão trabalhar em ambientes de insalubridade média ou baixa, exceto se apresentarem laudo médico recomendando o afastamento |
Home office | Não há regulamentação | As regras do chamado “teletrabalho” deverão constar no contrato. Os contratos antigos poderão ser alterados se houver concordância das partes |
Quitação de obrigações em caso de PDV e PDI | Não há regulamentação específica sobre o caso, sendo possível que o trabalhador que participe de um plano de demissão voluntária (PDV) ou incentivada (PDI) recorra à Justiça em busca de reparações | A adesão ao um PDV ou PDI significará a quitação de direitos trabalhistas. Em tese, eles não poderão ser reclamados posteriormente na Justiça |
Demissão em massa | Embora não haja lei, a Justiça considera que os sindicatos devem ser incluídos no processo | Não será necessário que o sindicato autorize, faça acordo ou convenção coletiva |
Livre negociação por faixa salarial e nível superior | Não há. Todos os contratos devem seguir as regras da legislação ou, se houver, de acordos coletivos | O acordo entre empresas e tralhadores com nível superior que recebem acima de dobro do teto da previdência (atualmente, de R$ 11.062,62) se sobrepõe a negociações coletivas |
Intervalo antes de hora extra | Os trabalhadores têm direito a uma pausa de 15 minutos antes de fazer hora extra | Não há direito a pausa antes de hora extra |