No mesmo dia em que voltava a vencer depois de oito meses, a Internacional perdia mais um campeão paulista de 1986.
Depois do zagueiro Juarez, do lateral-esquerdo Pecos, do centroavante Kita e do ponta-esquerda Gilson Gênio, agora foi a vez do roupeiro Joel Ferreira Pinto, o “Chapéu”, nos deixar aos 80 anos.
Chapéu trabalhou no Leão por 25 anos e faz parte da história do clube. Participou de todas as principais conquistas, como o Paulistão de 1986, a Série B do Campeonato Brasileiro de 1988 e a Série A-2 de 1996.
Chapéu, apelido que ganhou do meia Toinzinho na década de 80, disse em sua última entrevista no Pimba nos Esportes da Rádio Melhor FM, concedida em maio de 2022, que sempre sonhava com a Internacional. “Sonho que estou na minha sala, separando o material dos jogadores. Passei boa parte da minha vida no Limeirão”, disse.
Nascido em Ouro Fino, Minas Gerais, Chapéu veio para Limeira em 1980, depois de se cansar de trabalhar na roça. Acompanhou seus irmãos, que vieram tentar a sorte aqui. Um deles, o Ivo, passou a trabalhar no Limeirão. Já Chapéu foi para a Prefeitura, mas ficou apenas dois meses até ser transferido ao Major Levy.
Quando perguntado sobre como trabalhava, Chapéu respondeu que era organizado. “Na minha salinha mandava eu. Chegava bem cedinho e só ia embora para casa à noite. Vivia mais no Limeirão do que com minha família.
Respeitava todo mundo e os jogadores me respeitavam também. Em alguns casos a gente precisava ser mais duro, mas sempre com respeito. Nunca fiz inimizades”, disse na entrevista.
Sobre a final de 1986, Chapéu contou que estava tranquilo no Morumbi. “O empate sem gols no primeiro jogo com o Palmeiras, diante de 104 mil pagantes, nos fortaleceu ainda mais. O clima era muito positivo. Não tinha como dar errado. Naquele jogo decisivo eu fiquei atrás do gol onde justamente saíram os gols do Kita e do Tato. Eu pulava muito. A gente merecia aquele título. Pedi até para o saudoso Gilson Gênio ficar cuidando do vestiário no meu lugar para eu participar da festa”, lembrou.
Chapéu também contou que os jogadores faziam questão de dar um dinheirinho extra após as vitórias. Faziam até vaquinha para o bicho. “Uns colocavam no meu bolso. Outros entregavam na minha mão. Mas tinha os mãos de vaca que não davam dinheiro de jeito nenhum”, salientou.
Chapéu gostava de falar que seu melhor amigo era o goleiro Silas. “A gente tinha uma grande afinidade. Ele me tratava de forma diferente dos demais. Já o Carlos Silva, outro campeão daquele ano, era o mais engraçado. Divertia nosso ambiente”, confidenciou.
Sobre os treinadores, Chapéu rasgou elogios a Levir Culpi e Pepe. “Seu Macia me tratava como um filho dele”. Vale lembrar que ele recebeu um convite para trabalhar no Japão, mas recusou por conta dos filhos. “O roupeiro Bezerra que foi no meu lugar e ficou rico”, sorriu.
Chapéu relatou no Pimba uma briga que presenciou entre Bolívar e Salomão. “Não tinha como separar. O Salomão levou a pior nessa. Ficou todo unhado. Vi também o Bolívar pegando o saudoso Pecos. Para você ter uma ideia, o Pecos ficou com tanto medo que saiu por trás do Limeirão para não cruzar com o xerife no estacionamento”, contou.
Chapéu não escondia sua torcida pelo Santos. Seu sonho era conhecer o Rei Pelé. “Só o vi pela televisão”. O roupeiro chegou a ter coleção de camisas, mas doou todas. Mas fez questão de guardar ao longo de sua vida a camisa que usou na final de 1986, a medalha e a faixa de campeão.
Chapéu conheceu o Brasil todo com a Inter. Esteve nos principais estádios do país. Quando podia, ia ao Limeirão assistir aos jogos, sempre tendo ao lado o filho Carlão, seu fiel escudeiro.
Chapéu disse que sua única tristeza foi ter sido demitido da Internacional em 2003. O gerente de futebol Júnior Barros trouxe um roupeiro do Rio Branco para o seu lugar.
Seu Joel constituiu uma linda família com a saudosa Aurora, que nos deixou há nove anos. Foram 42 anos de casado. Chapéu também deixa as filhas Sione e Simone e os netos Pedro e Kevin. Ele foi sepultado na segunda-feira à tarde, no Cemitério Parque.