A votação expressiva e pulverizada dos outsiders eleitos para a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) derrubou uma série de lideranças políticas locais, deixando importantes regiões do Estado, como Bauru e São José do Rio Preto, “órfãs” de representação no parlamento paulista. Ao todo, sete das 16 regiões administrativas do Estado perderam cadeiras na Alesp e outros sete mantiveram o mesmo número de deputados estaduais eleitos em 2014 – apenas Franca e São José dos Campos ganharam uma vaga a mais, cada um, no Legislativo paulista, que tem 94 parlamentares.
Por outro lado, o número de deputados sem reduto eleitoral específico que saíram vitoriosos do pleito de outubro mais do que dobrou, passando de 14 para 32. A lista inclui sete dos dez candidatos mais votados na eleição, entre os quais a recordista Janaina Paschoal (PSL), que teve 2 milhões de votos.
Estreante nas urnas, a autora do pedido de impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff (PT) é apontada como a principal responsável por ‘roubar’ votos de lideranças políticas históricas do interior e da capital, estrago proporcional ao que o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) fez no desempenho do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo na corrida presidencial.
Segundo os parlamentares, quem tinha base eleitoral em grandes centros urbanos do interior e da Grande São Paulo se deu mal. A campanha tradicional, baseada em apoios de outros políticos locais, como prefeitos e vereadores, perdeu espaço para as ações massivas nas redes sociais e no WhatsApp, ferramentas bastante exploradas pelos oursiders eleitos.
“O uso das redes sociais nessa eleição foi determinante porque conseguiu criar um sentimento no País todo de “vamos renovar”. Até entre meus amigos, acabei me tornando um estranho no ninho”, disse o deputado Vaz de Lima (PSDB), que não conseguiu se reeleger pela primeira vez em 24 anos.
Ex-presidente da Alesp, o tucano perdeu mais da metade dos votos obtidos há quatro anos – caiu de 113.422 para 51.629 – e foi um dos quatro parlamentares da região de São José do Rio Preto a perder a cadeira na Alesp. A mais votada naquele município foi Janaina.
“Tentei usar as redes sociais, mas talvez tenhamos nos equivocado ao usar o Facebook, quando a influência veio principalmente do Whatsapp”, lamentou Vaz de Lima. Na próxima legislatura, os cerca de 1,5 milhão de moradores da região, que tinham cinco representantes, terão agora apenas um: Carlão Pignatari (PSDB), que tem base em Votuporanga.
Já a região de Bauru, que concentra 1,1 milhão de habitantes, ficará pela primeira vez, desde 1998, sem representante . O pastor Celso Nascimento (PSC) não conseguiu se reeleger e o tucano Pedro Tobias nem disputou. Também nesta região, Janaina foi a mais votada.
Encolhimento
As duas regiões metropolitanas mais ricas do Estado depois da Grande São Paulo, Campinas e Sorocaba, também viram suas bancadas regionais encolherem em mais de 25%. Após cinco mandatos na Alesp, o deputado Aldo Demarchi (DEM) também foi vítima da onda que varreu parte da política tradicional paulista – o índice de renovação na Alesp foi de 55%.
“Foi esse efeito, que foi geral, da população querendo mudanças e, principalmente, a divulgação em redes sociais”, disse Demarchi, que tem base eleitoral em Rio Claro. Segundo ele, a população da região vai sentir a falta de um representante local no Parlamento. “O tempo vai mostrar o prejuízo dessas cidades”.
Outras lideranças regionais históricas da Alesp, como Beth Sahão (PT), de Catanduva; Célia Leão (PSDB), de Campinas; João Caramez (PSB), de Barueri; e Roberto Massafera (PSDB), de Araraquara, também perderam votos em suas bases e, consequentemente, seus mandatos.
Outro algoz da “velha guarda” da política paulista foi o youtuber Arthur do Val (DEM), do Movimento Brasil Livre (MBL). Segundo deputado mais votado em todo o Estado, com 478 mil votos, ele desbancou políticos tradicionais em grandes cidades como Campinas, Guarulhos e São José dos Campos, com uma campanha focada nas redes sociais e um discurso ideológico, sem regionalismos.
Diluição
Os parlamentares que sobreviveram à onda da renovação e conseguiram manter seus mandatos na Alesp atribuem o resultado aos votos diluídos nas pequenas cidades. “Perdi quase metade dos meus votos na capital, mas consegui me reeleger graças ao trabalho que fiz nos municípios pequenos do interior”, disse Jorge Caruso (MDB), que colheu suas maiores votações em Agudos, Casa Branca, Jaguariúna, Peruíbe e Tapiritiba.
Para o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a queda das lideranças regionais de São Paulo está associada ao declínio político de Alckmin no Estado, em detrimento da ascensão de Bolsonaro. Um processo, segundo ele, alavancado pela campanha feita nas redes sociais.
“Os eleitores desses candidatos (lideranças tradicionais), que faziam voto casado com candidatos ao governo e à Presidência, acabaram de certa forma desprestigiando as lideranças locais. O custo disso é que a região fica sem uma liderança mais local que tenha uma capacidade de maior agilidade para defender seus interesses e não vai ter o mesmo vínculo, mais direto, mais próximo com essas lideranças que chegaram e tem outros compromissos”, disse.
Já o professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo Rui Tavares Maluf afirmou que “foi uma onda muito forte provocada por um sentimento generalizado na necessidade de mudança”.