Imagine se tornar um personagem da Disney, um animal ou um ET em questão de segundos. Basta arrastar o dedo pela tela do celular e pronto: está lá seu rosto, transformado em um bicho ou personagem. Não é feitiçaria, é tecnologia: a transfiguração ocorre graças aos filtros de redes sociais como o Instagram. Mais do que só uma diversão, porém, esses recursos têm virado uma nova fonte de renda para produtores de conteúdo e influenciadores.
É o caso da designer carioca Vanessa Dutra, de 27 anos: em maio, seu perfil @sereiahipster viralizou depois que ela criou um filtro baseado na frase “juntos e shallow now”, parte da versão que a cantora Paula Fernandes fez para “Shallow”, de Lady Gaga. Com mais de 50 milhões de impressões, o efeito foi usado por vários artistas – incluindo a própria sertaneja. Após o episódio, a designer começou a ser procurada por marcas como Samsung, Spotify e Levi’s para criar peças por encomenda.
“Fechei o primeiro trabalho em junho e tenho sido procurada desde então”,diz Vanessa. Até agora, mais de 20 marcas já entraram em contato e sete trabalhos foram fechados – cada um por R$ 2 mil. O filtro também alçou a carioca à fama: hoje, ela soma mais de 284 mil seguidores no Instagram e já dá até palestras sobre o assunto.
Mestrando em Matemática, Tarcísio Caleiro, de 23 anos, usa os efeitos para conseguir um dinheiro extra. Cobra até R$ 1,3 mil por filtro. Desde agosto, já realizou seis encomendas para clientes como o canal de YouTube Irmãos Piologo e a página Greengo Dictionary. “Sempre gostei de mexer com efeitos, testava filtros no Snapchat, e vi que procuravam esse tipo de trabalho. Resolvi aprender”, diz.
COMO FAZ?
A personalização de filtros é recente no Instagram: em agosto, o Facebook, dono da rede social, liberou para o público em geral o Spark AR Studio, que permite que qualquer pessoa crie seus próprios efeitos em realidade aumentada. Popularizada por jogos como Pokémon Go, a tecnologia sobrepõe uma camada virtual sobre o mundo real. Uma versão de testes do Spark AR já estava disponível desde o início do ano para usuários, como Vanessa.
Para criar efeitos simples, não é preciso ter conhecimentos técnicos de design ou 3D – o próprio Spark AR têm modelos que podem ser modificados pelos usuários. Já trabalhos mais elaborados demandam habilidade.
No site do programa, há aulas e tutoriais para os aspirantes a produtor de conteúdo, bem como grupos no Facebook voltados para a prática – o Spark Brasil tem cerca de 2 mil pessoas; já a comunidade global Spark AR Community tem quase 70 mil usuários. Depois que o filtro é finalizado, o produtor de conteúdo precisa enviar o efeito ao Instagram para aprovação – em média, um pedido leva entre 5 e 10 dias para ser liberado.
Ao ‘Estado’, o Instagram disse não ter dados sobre o número de brasileiros que usam o Spark AR. “Ficamos satisfeitos com a amplitude e variedade de efeitos que temos visto”, disse um porta-voz da empresa por e-mail.
Para o consultor em mídias digitais Alexandre Inagaki, o sucesso dos filtros no Instagram é mais uma amostra de como a empresa soube vencer a guerra de redes sociais contra plataformas como o Snapchat, onde os filtros começaram a ganhar popularidade. “Eles copiaram as melhores características da outra rede e as popularizaram ainda mais”, diz.
Como os filtros circulam nos Stories, serviço de mensagens efêmeras do Instagram, eles podem ser nova fonte de receita. “O Instagram têm parado de oferecer números abertos, como o de curtidas em fotos. Os números de alcance de estatística dos Stories já são restritos; com os filtros, empresas interessadas nos dados vão pagar”, especula. “Além de anúncios, o Instagram pode cobrar pelos dados.”
VITRINE OU FANTASIA?
A cadeia de faturamento com os filtros do Instagram, porém, não se encerra apenas em quem cria os efeitos e com a plataforma de divulgação. Afinal, é interessante para as marcas que eles se popularizem pela rede social – e para isso, é preciso contratar influenciadores para usar o recurso.
Especializada em conteúdos de moda, a baiana Rafaela Fluer, de 23 anos, foi selecionada por uma empresa de turismo para usar um filtro relacionado ao Carnaval de Salvador. A “blogueira” não divulga quanto ganhou com o contrato, mas o Estado apurou que um influenciador pode cobrar entre R$ 600 e R$ 4 mil para usar um filtro, variando conforme o número de seguidores e o engajamento do perfil.
Há ainda quem atue nas duas esferas, produzindo e divulgando efeitos para marcas. O publicitário Bernardo Borba, de 30 anos, por exemplo, já realizou e “distribuiu” um efeito para o Itaú durante o último Rock in Rio. Dono da conta @bernardofala, com conteúdo de humor sobre gordofobia e homofobia, ele soma quase 55 mil seguidores no Instagram. Assim como Vanessa Dutra, sua produção começou de forma espontânea – uma brincadeira com a gíria “biscoitar”, ou seja, “pedir atenção e elogios na internet”.
“Já cheguei a ter filtro com 4 milhões de impressões e mais gente começou a me seguir por isso”, afirma. “Os filtros são muito positivos. São mais um jeito que os produtores de conteúdo têm para alcançar o público.”