O ano de 2019 pode entrar para a história como o que mudou para sempre o futebol mundial. A partir das próximas semanas, a Fifa, clubes, patrocinadores e federações, um batalhão de lobistas, advogados e investidores multibilionários tomarão decisões que determinarão o futuro da modalidade e, para observadores, a organização do futebol como se conhece hoje pode desaparecer para sempre. Para o atual presidente da Fifa, Gianni Infantino, há algo mais em jogo que a estrutura do futebol mundial: sua própria reeleição.
No centro do debate está a proposta de vender a Copa do Mundo para investigadores privados, liderados por um consórcio obscuro que propôs um retorno para os dirigentes de US$ 25 bilhões (aproximadamente R$ 93 bilhões), cinco vezes a receita atual do Mundial. O plano prevê abrir o monopólio hoje mantido pela Fifa para abrir a Copa para fundos de investimentos, com 50% das ações não mãos de bancos e outras entidades. A suspeita é de que o projeto conte, acima de tudo, com recursos do fundo soberano saudita. Apenas em 2018, Infantino se reuniu três vezes com a realeza do país árabe.
Diante da resistência de dirigentes europeus à possibilidade de um controle saudita no futebol, Infantino foi obrigado a dar garantias de que o dinheiro não viria do fundo de Riad e adiou o debate sobre sua aprovação.
Ainda assim, cartolas mantêm a suspeita de que as várias camadas de investidores apresentados estejam servindo para camuflar a verdadeira origem dos recursos sauditas. A decisão ocorre em um momento em que o príncipe herdeiro saudita, Mohamed Bin Salman, tem sua imagem no exterior duramente afetada por conta da morte de um jornalista crítico ao regime.
Além da Copa do Mundo, o pacote marcado pela pouca transparência incluiria a criação de um Mundial de Clubes a cada quatro anos, substituindo ao atual modelo falido do torneio no final de cada ano e substituindo a Copa das Confederações.
Fontes na Uefa confirmaram ao Estado que existe uma coincidência de interesses: clubes se recusam a aceitar o projeto de um Mundial a cada quatro anos, sem uma clara garantia financeira. Já a Uefa vê a aliança com os clubes como uma manobra para derrubar projetos de Infantino e, assim, o enfraquecer.
Infantino voltou a pressionar o Catar para ampliar o Mundial de 2022 de 36 para 48 seleções. A mudança já está garantida para 2026. Mas não o daria os votos necessários para 2019.
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Ali, o desafio vai muito além das quatro linhas. Menor sede da história das Copas, o Catar precisaria ampliar o Mundial para outros países para que o projeto seja viável. O problema é que o minúsculo país do Oriente Médio vive um embargo por parte de seus vizinhos, que o acusam de financiar o terrorismo e tentar desestabilizar a região.
Nesta semana, falado em um evento em Dubai, Infantino afirmou que a possibilidade de levar o Mundial para outros países árabes estava sendo debatida. “Se podemos aumentar a Copa para 48 seleções e fazer o mundo mais feliz, deveríamos tentar”, disse. Se o projeto incluindo sauditas e os governos dos Emirados Árabes Unidas e Bahrein não for consolidado, não se exclui levar algumas das partidas para Omã, Irã ou Turquia.
Em duas semanas, a Fifa começará a tomar decisões. Uma reunião no Marrocos tem como objetivo apresentar desenho inicial do que seria um acordo. Já em março, num encontro planeado para ocorrer nos Estados Unidos, a Fifa espera bater o martelo sobre o que será o futuro do futebol.
Mas um dos dirigentes convocados para o encontro confirmou à reportagem que não prevê uma decisão fácil. “O que está em jogo é o futuro do esporte mais popular do planeta.”