É possível amar alguém que você nunca poderá tocar? A pergunta é feita e respondida pelo filme A Cinco Passos de Você, que estreia nesta quinta-feira, 21, e conta a história de dois jovens com fibrose cística (FC) que se apaixonam enquanto passam pelo tratamento da doença em um hospital.
Os personagens da trama lembram os de A Culpa é das Estrelas (2014), com um garoto “rebelde” e uma garota “certinha”, mas não se trata da mesma condição de saúde. No filme inspirado no livro best-seller de John Green, Hazel e Gus têm câncer. No ano de lançamento, o longa-metragem foi o mais visto no Brasil.
Em A Cinco Passos de Você, Will (Cole Sprouse) e Stella (Haley Lu Richardson) vivem um amor diferente, pois precisam ficar longe um do outro a uma distância de aproximadamente seis passos – que serão reduzidos para cinco no decorrer da história
Embora retrate bem a realidade de internação, com a necessidade de muitos medicamentos por dia e outros métodos terapêuticos no tratamento, a questão da distância é relativa, segundo Jader Baima, diretor médico da Vertex no Brasil. No caso do filme, há um risco específico que não será contado aqui – spoiler é deselegante.
“Mas tem um lado interessante, que é o aspecto psicossocial: por ter doença crônica grave, a pessoa tem limitação social, de convivência, de ir à escola com regularidade”, avalia o especialista em fibrose cística.
O que é fibrose cística?
Baima explica que a fibrose cística é uma doença rara genética, cuja mutação de um gene afeta uma proteína presente em vários órgãos. Quando ataca o pulmão, é comum que os pacientes fiquem internados com frequência devido a infecções constantes. Segundo o último relatório sobre fibrose cística, de 2016, os diagnosticados com a doença passam, em média, 26 dias do ano internados. No Brasil, estima-se que haja cerca de 4,6 mil pessoas com FC.
“Com esse defeito genético, a proteína deficiente faz com que a pessoa tenha infecções. Esse comprometimento gera a fibrose, provoca como se fosse a morte do tecido. Vai progredindo, comprometendo de muitas formas, até haver necessidade de transplante pulmonar”, explica Baima.
O transplante, porém, retratado no filme, não é muito comum, uma vez que os tratamentos atuais controlam a doença. O médico diz que o procedimento só é considerado quando a fibrose cística compromete de forma grave e progressiva o pulmão. Além disso, ele pontua que o tempo de vida do órgão transplantado não é muito grande e, dependendo do caso, a FC pode se manifestar novamente.
Sintomas
Pneumonia e bronquite recorrentes, tosse constante com catarro e, eventualmente sangue, dificuldade de crescimento e ganho de peso abaixo do normal podem ser os primeiros indicativos de fibrose cística. Além disso, o muco do pulmão fica mais espesso do que o normal, o que dificulta a respiração.
Antes que os sinais apareçam, é possível saber se há indícios por meio do teste do pezinho. Essa triagem neonatal não determina que o bebê tem ou não fibrose cística, mas aponta se há necessidade de exames complementares. Quando há suspeita, o teste do suor pode ser mais assertivo no diagnóstico da fibrose cística. Nele, coleta-se gotas de suor para medir a concentração de cloro, que deixa o líquido salgado. Um nível determinado indica existência da doença. O suor salgado se dá por conta da alteração da proteína nas glândulas sudoríparas.
Baima explica que o muco espesso no pulmão faz com que a pessoa fique mais suscetível a infecções pulmonares crônicas. Elas são causadas por bactérias, fungos ou vírus. No filme, Will tem uma bactéria muito resistente e passa por um tratamento novo.
Tratamento
O tratamento varia de acordo com o paciente e, atualmente, os medicamentos disponíveis proporcionam melhor qualidade de vida e promovem o controle da fibrose cística. A psicóloga Verônica Stasiak Bednarczuk de Oliveira, de 32 anos, é exemplo disso.
“O tratamento é diário. Faço atividade física, fisioterapia respiratória, inalação, tomo suplementos, antibióticos”, conta.
“Hoje, por conta do diagnóstico e do tratamento, (minha fibrose cística) está controlada”, afirma Verônica. É que antes do diagnóstico, aos 23 anos de idade, a psicóloga sofreu com infecções graves no pulmão, pneumonia recorrente e cerca de cinco internações por ano. Em 2009, depois de ficar dois meses internada com pneumonia grave no hospital e um mês em casa, ela voltou para o centro de saúde com pancreatite. Foi aí que, pelo histórico, um médico suspeitou que fosse fibrose cística.
Até os 23 anos, Verônica sofreu com quadros graves de pneumonia e teve de tirar duas partes do pulmão direito quando tinha 18 anos. Após o diagnóstico, chegou a ser internada por conta de um fungo no órgão, a última vez há um ano e meio. Por conta de pneumonia, faz três anos que não se interna.
Atualmente, ela é mãe de uma menina de três meses, sendo que a maternidade, às vezes, é um tabu para quem tem fibrose cística. Baima explica que, para a doença se manifestar, é preciso que a criança tenha o gene defeituoso da mãe e do pai. Verônica planejou a gravidez junto aos médicos e foi liberada para tentar engravidar quando sua condição de saúde era favorável.
Durante a gestação, que transcorreu normalmente, ela continuou com o tratamento. “O que fez a diferença foi a adesão ao tratamento, a condição clínica e o acompanhamento médico próximo”, diz a psicóloga. Com o teste do pezinho, ela sabe que a filha não tem fibrose cística.
Verônica fundou o Instituto Unidos Pela Vida, que promove ações em prol de pacientes com fibrose cística e divulga informações sobre a doença. Ela reforça a necessidade de se falar cada vez mais sobre a FC, a fim de que se possa ter um diagnóstico precoce. Com o filme A Cinco Passos de Você, ela espera que isso seja mais estimulado pelo mundo.