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Fila por dinheiro: moradores de SP escaneiam íris para ganhar criptomoedas, mas especialistas alertam sobre riscos

Paulo Pinto/Agência Brasil

Nos arredores da Avenida Paulista, em São Paulo, um cenário curioso tem chamado a atenção: pessoas se reúnem para escanear suas íris em troca de criptomoedas. Embora muitas não saibam exatamente como a tecnologia funciona, o atrativo principal é o dinheiro rápido. O procedimento é promovido pela empresa Tools for Humanity, por meio do projeto World ID, que promete diferenciar humanos de robôs e IA por meio da biometria ocular.

Como funciona?

O processo começa com o download do World App, onde o interessado agenda um horário em um dos pontos de escaneamento pela cidade. No local, uma câmera avançada chamada Orb captura a imagem da íris, que é transformada em um código de validação único. Em troca, os participantes recebem 48 Worldcoins – uma criptomoeda da empresa que pode ser convertida em dinheiro.

O motoboy Bruno Barbosa, de 25 anos, participou e contou que o processo é rápido. “Baixei o aplicativo, agendei, fui lá e fiz. Eles pagaram cerca de R$ 200 em criptomoedas, que caiu na minha conta no outro dia. É simples, mas dá um pouco de receio, né? Não sabemos para que estão usando esses dados.”

Quem está participando?

Desde casais de idosos, como Jurema, de 72 anos, e José Virgílio, de 73, até trabalhadores que enfrentam dificuldades financeiras, como Wallace Weslley, de 31 anos, muitos afirmam que só participam por causa da recompensa financeira. “A gente viu um anúncio e fomos lá. Disseram que era para garantir que somos humanos, e que os dados são apagados na hora. Mas se fosse de graça, eu não faria”, contou Jurema.

Segundo relatos, as explicações no local sobre o projeto são breves. Em alguns casos, os participantes assistem a um vídeo rápido, enquanto outros afirmam não ter recebido explicações detalhadas.

O que dizem os especialistas?

Apesar da promessa de anonimização e segurança, especialistas em privacidade alertam para os riscos da coleta de dados biométricos. Nathan Paschoalini, pesquisador da Data Privacy Brasil, destaca que a íris é um dado extremamente sensível e único, capaz de identificar uma pessoa ao longo de toda a sua vida.

“Estamos falando de um dado que, se vazado, pode abrir portas para discriminação, fraudes e abusos. O consentimento dado pelas pessoas, muitas vezes em troca de dinheiro, pode ser considerado questionável e até exploratório. A privacidade delas está em jogo”, explicou Paschoalini.

Karen Borges, do NIC.br, também alerta sobre a transparência no uso desses dados. “As pessoas devem avaliar se é realmente necessário ceder esse tipo de informação e entender como ela será usada. A falta de informações claras e confiáveis é preocupante.”

Empresa se defende

Em resposta às preocupações, Rodrigo Tozzi, representante da Tools for Humanity no Brasil, afirmou que o projeto é seguro e que os dados são criptografados e excluídos após o processo. Segundo ele, o objetivo principal é criar uma prova de humanidade para evitar fraudes digitais e proteger a identidade no ambiente online.

“Os códigos gerados a partir da íris são armazenados de forma descentralizada e anônima. Não solicitamos dados como nome, idade ou documentos. A Worldcoin é uma iniciativa voltada para a privacidade e segurança das pessoas na era da inteligência artificial”, garantiu Tozzi.

Investigação em andamento

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) abriu uma investigação sobre o tratamento dos dados biométricos no projeto. Em nota, a ANPD destacou que dados como a íris são classificados como informações sensíveis e estão sujeitos a regras rigorosas de proteção. A Tools for Humanity já apresentou documentos solicitados pelo órgão, que segue analisando o caso.

O futuro do projeto

Enquanto a promessa de dinheiro rápido atrai mais pessoas, os riscos associados ao uso de dados biométricos ainda geram muitas dúvidas. Para especialistas, é fundamental que o público reflita sobre as consequências de compartilhar informações tão sensíveis. Afinal, será que o dinheiro rápido vale o risco?

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