A história que será contada em alguns anos é essa: a música produzida em Belo Horizonte e Minas Gerais naquele início de década de 1990 era rica, mas o engessado mercado da música da época só queria saber de Milton Nascimento e outros que bebiam diretamente dessa (ótima, é bom dizer) fonte “clubedaesquinística”. O rock brasileiro florescera na década anterior, em polos como Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, mas Minas, estado que tinha bandas com sucesso local, não ganhava repercussão nacional. Um CDzinho demo com o primeiro álbum do Skank, uma banda de rock que tentava criar o dancehall (a grosso modo, um reggae sem ser tão político ou religioso) em uma cidade escondida por montanhas chegou ao Rio de Janeiro nas férias de verão, a bordo dos carros de mineiros que curtiriam as praias cariocas naquela temporada. E, assim, veio o primeiro contrato, o primeiro disco e a história que ajudou a moldar o que se entende como pop-rock daquela geração.
Mas quem ouve à essa história são Samuel Rosa, Henrique Portugal, Lelo Zaneti e Haroldo Ferretti de hoje, de 2018, todos por volta dos seus 50 anos (Ferretti é o único com 49 ainda). Para eles, é assim que será contado o começo do Skank no futuro, mas, por enquanto, eles podem dizer que se trata de uma história “romantizada demais”, brinca Rosa.
“Mas é importante ressaltar que Belo Horizonte ficou à margem do rock brasileiro dos anos 1980. E que essa geração de bandas da década seguinte apareceu como uma surpresa. Gente que misturava ritmos, rock com maracatu, com forró, com reggae.”
O Skank vem de um raro momento de olhar para trás na carreira. Eles, que sequer tem uma versão de disco “acústico” (moda para a geração de bandas nacionais nascidas até o início os anos 2000), se permitiram esse resgate do passado, com o lançamento hoje do primeiro de três EPs gravados ao vivo que integra o projeto Os 3 Primeiros.
Como o nome diz, trata-se de um resgate das canções dos três primeiros discos da banda – Skank (1993), Calango (1994) e O Samba Poconé (1996) – que não foram “as músicas de trabalho” (termo adorado na época), ou foram engolidas pelos hits radiofônicos que levaram o Skank a rodar o País e o mundo naqueles três anos intensos, como é o caso de Jackie Tequila e Te Ver (de Calango), ou Garota Nacional, Tão Seu e É Uma Partida de Futebol (do Samba Paconé). Gravado a partir de um show realizado no Circo Voador, no Rio de Janeiro, o projeto Os 3 Primeiros dá espaço para músicas como Tanto (I Want You), Homem Que Sabia Demais e In(Dig)nação, todas do primeiro álbum.
Cada um dos EPs trará algumas das canções (na versão ao vivo gravada em vídeo e áudio no Circo Voador) de cada um dos três primeiros discos, a começar por Skank, que sai nesta sexta-feira, 1º. O EP2, com músicas de Calango, sairá em 14 de setembro. O EP com versões de Samba Poconé chega às plataformas digitais no dia 28 deste mês. O DVD do show completo chega às lojas em 5 de outubro.
Mas o Skank de hoje não olha apenas para o retrovisor para observar a estrada que ficou para trás. Com o lançamento, eles colocarão na rua a música Beijo na Guanabara, música da época de 1990, mas nunca gravada pela banda. Desde agosto, as rádios já tocam Algo Parecido, canção que tem a pegada do Skank atual (mais leveza e violão). “Esses três primeiros discos marcaram uma sonoridade da banda”, explica Samuel. A partir do quarto trabalho, o Skank se aproxima do que a gente ouve hoje. “Desde o começo, nossa ideia era, com esse lançamento, também mostrar músicas inéditas”, ele explica. A estrada, afinal, segue em frente.
SANK
Os 3 Primeiros
Sony Music; R$ 19,90 (plataformas digitais)