A região de Vinhedo chegou ao sexto dia seguido de incêndios. Matas, plantações e sítios foram atingidos pelo fogo, que afetou cerca de 4 km² em diferentes partes do município do interior paulista. A situação foi atenuada somente nesta sexta-feira, 2, com o reforço de dois helicópteros nas ações, que envolveram mata de difícil acesso. Os danos ambientais e econômicos ainda não foram contabilizados.
Outros municípios paulistas também têm enfrentado situações do tipo, especialmente deste setembro, mês em que o número de queimadas bateu recorde no Estado. Segundo o Programa Queimadas, do Inpe, foram 2.254 focos de incêndio, o maior valor desde o início do registro histórico, em 1998. Em relação a setembro do ano passado, que registrou 872 focos, isso representa alta de 158%. A aposentada Regina Nano, de 64 anos, praticamente não dormiu nas últimas noites. De casa, conseguia ver e ouvir os estalos da queima da mata, fogo que se tornava mais intenso justamente após o entardecer. “Não consigo dormir, meio que fico monitorando. É uma mata tão linda, nunca pensei que fosse queimar.”
Uma das principais dificuldades para a contenção dos focos é a disponibilidade de apenas um caminhão do Corpo de Bombeiros no município e, por isso, grande parte dos trabalhos foi liderada por moradores. “Falta um planejamento de contingência do governo estadual e regional, os municípios ficam a Deus dará”, lamenta o aposentado Vittorio Gilberto Zottino, de 70 anos, vice-presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema), de Vinhedo.
Entre a população que atuou no combate às chamas está o gerente de negócios Eduardo Freitas, de 49 anos, presidente de uma associação de moradores da região. “Teve uma grande mobilização popular, dos moradores com mangueiras, abafadores, recursos mínimos, inclusive avançando em pontos que os bombeiros não podem entrar”, comenta. “A gente apaga, faz abafamento. Depois, retorna, por causa de troncos de árvores queimando.”
Mesmo com a situação mais controlada, Freitas defende que as ações para contenção precisam persistir, ainda mais porque a seca continuará por mais uma semana. “Ainda estamos em alerta máximo”, comenta. “Não tínhamos nenhuma previsão de como atuar. Realmente foi tudo improvisado, com recurso dos moradores e mínimo de recursos de bombeiros e Defesa Civil.”
O engenheiro civil Paulo Steorani Neto, de 60 anos, combatia as chamas no seu sítio quando falou com o Estadão. “Moro desde que nasci em Vinhedo. Várias vezes a região teve esses eventos. Eu sempre fiz aceiro, quase perdi um trator num dos incêndios, quase morreu empregado meu. Mas o que aconteceu neste ano foi atípico.”
Com a fumaça intensa, moradores chegaram a deixar as casas, principalmente em áreas mais próximas de focos e com problemas respiratórios. Outros trancaram-se dentro de cômodos, cujas janelas e portas eram isoladas com toalhas molhadas. O comerciante Danilo Catelano, de 55 anos, que mora no centro, fora das áreas queimadas, percebeu a presença de fuligem e fumaça pela cidade.
Prejuízos
Os incêndios também têm trazido prejuízos financeiros. É o caso de Elso Previtali, de 69 anos, o quarto de uma geração de agricultores. Entristecido com a situação, diz ter desistido de manter a plantação e pretende vendê-la.
Filho do agricultor, o engenheiro agrônomo Rafael Previtali, de 40 anos, calcula que foram atingidas até 3 mil mangueiras da propriedade. “Ninguém olhou por nós. Aquilo é o nosso ganha-pão”, lamenta. Além disso, o fogo também consumiu uma área de mata nativa dentro do sítio. “É uma coisa que, para recuperar, precisa de uns cem anos. Tinha papagaio, jacu, três espécies de macaco, muito tatu, jequitibás.”
Previtali destaca que o fogo chegou na propriedade na quarta-feira, momento em que os incêndios já eram de amplo conhecimento na região e, portanto, poderia ser evitado. “Na terça, minha irmã foi até os bombeiros, e eles disseram que estava sob controle”, critica.
Poder público
Em nota, a Prefeitura de Vinhedo afirmou ter solicitado apoio do governo estadual desde domingo, especialmente em relação ao envio de uma aeronave. Somente na sexta, contudo, o poder estadual mandou um helicóptero ao local, quando o Município já havia contratado o serviço.
A gestão municipal ressaltou ter enviado 30 homens para combater o fogo e ofertado caminhões-pipa e apoio de órgãos públicos. Além disso, declarou que a origem do incêndio será apurada posteriormente e “a concentração de esforços está na extinção das chamas”.
Já o governo estadual, também por nota, destacou que 12 bombeiros atuam no local, além de brigadistas e voluntários. Além disso, ressaltou ter investido R$ 6 milhões em atividades preventivas da Operação Corta-Fogo. “Vale ressaltar que o Estado de São Paulo está no período de estiagem, com fortes ondas de calor e baixa umidade relativa do ar. Conforme alerta da Defesa Civil do Estado, as temperaturas até o próximo sábado podem passar dos 40 graus em algumas regiões do Estado. Historicamente, agosto e setembro são os meses com mais focos de incêndio.”