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Ouvir verdadeiramente: a grande sacada para não nos tornarmos ‘os chatos da lição de moral’

Em um mundo cheio de pressa, com pessoas cheias de informações prontas e poucas construções de conhecimento, seja a partir do estudo criterioso, seja a partir das vivências acumuladas ou ambos, deparamo-nos, grande parte do tempo, com conversas superficiais, pessoas que sabem de tudo e que têm ‘excelentes conselhos’ para nos dar (e ‘inclusive não segui-los pode ser até mesmo sinal de burrice’).

Quantas vezes temos dificuldade de mostrarmos o que pensamos, temos dúvidas se devemos ou não expor nossos pensamentos (ainda que os mais simples), nosso ponto de vista, pois nunca sabemos quem são os ‘sábios e cheios de razão’ que nos escutarão prontos para travar uma verdadeira batalha sobre o que dissermos… que pode ser até uma coisinha singela, só pra não ficar calado mesmo… áh… está valendo MUITO a pena ficar quieto.

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Há muito tempo, já afirmava o querido, sábio, excelente observador e ótimo ouvinte, o mestre Rubem Alves: “Buscamos, no outro, não a sabedoria do conselho, mas o silêncio da escuta; não a solidez do músculo, mas o colo que acolhe.”.

Tão bom encontrar pessoas dotadas de “bons ouvidos internos”, aqueles de alma, aqueles de cuidado, de empatia, de serenidade… aqueles ouvidos que nos escutam integralmente, sem julgamento algum, sem nos rebater, sem nos achar estranhos, sem ter alguma crítica importante a fazer, algum apontamento fundamental a marcar… Apenas escutam, entendendo que quem fala o faz porque precisa falar, porque é importante falar, porque precisa de alguém que escute.

Os judaicos em sua sabedoria infinita ensinam-nos que “Na procura de conhecimentos, o primeiro passo é o silêncio, o segundo ouvir, o terceiro relembrar, o quarto praticar e o quinto ensinar aos outros.”. Áh que belíssimo ensinamento este!!! Quer dizer que antes de termos muito a falar, naquela ‘verborragia’ fútil e vazia (cheia de certezas vexatórias) precisamos ter passado pelo silêncio, termos ouvido muito, termos relembrado de tudo, praticado o que ouvimos, para só então nos darmos ao luxo de abrirmos a boca para ‘ensinar’.

Coisa mais chata conversar com quem sempre conhece mais, sabe mais, já viu mais, tem um bom conselho, uma boa lição, um ‘questionamento genial’ (como se quem o fala já não tivesse feito o magnânimo questionamento). Coisa mais chata gente que se usa como exemplo, que pega a tristeza do outro, a dor daquele que fala (e que está precisando fazer) e traz para si e transforma-se, de repente e não mais que de repente, em um grande professor do assunto, que passou e sofreu (talvez ainda sofra só por causa da fala do ‘pobre mortal’ que ousou abrir a boca). Coisa mais chata o sujeito ‘misericordioso’ e ‘abnegado’ que resolve dar conselhos sem que tenha sido lhe solicitado, que aparece com lições, sem que estas sejam, de fato, necessárias de serem contadas e ditas!
SIM, nem sempre quem fala busca lições, conselhos e direcionamento! Quem fala, muitas vezes o faz, para dividir a angústia, para tirar de dentro de si aquela dor que corrói e quando acaba de falar, escuta: “Ah, mas você não sabe o que eu passei, como eu sofri, como eu sofro, como eu fui magoado, como isso e aquilo. Aliás, por que você não faz assim ou assado?”. Aaaaaaaa, porque eu só queria falar e ser ouvido, porque não queria competir e ver quem sofreu ou se magoou mais, porque eu não queria um Ph.D. me apontando caminhos…

Outra pessoa muito sábia, ponderada e que nos convida à fantásticas reflexões é Pe. Fábio de Melo, que diz: “Só dê ouvidos a quem te ama. Cuidado com as acusações de quem não te conhece. Não coloque sua atenção em frases que te acusam injustamente. Não se ocupe demais com opiniões de pessoas estranhas. Só a cumplicidade e conhecimento mútuo pode autorizar alguém a dizer alguma coisa a respeito do outro. Repito: Só dê ouvidos a quem te ama. Tudo mais é palavra perdida, sem alvo, sem motivo. Só mais uma coisa: Não te preocupes tanto com o que acham de ti. Quem geralmente acha não achou nem sabe ver a beleza dos avessos que nem sempre tu revelas.”.

E para nós, fica a reflexão: somos bons ouvintes? Quem nos procura para falar um pouco, encontra em nós escuta empática ou julgamentos, lições e apontamentos não solicitados?
Sejamos escuta, quando o outro precisar falar!

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