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O western brasileiro ‘O Matador’, de Marcelo Galvão, estreia na Netflix

Em maio, o Festival de Cannes fez história programando um filme da Netflix, Okja, na competição. O que deveria ser celebração virou a maior polêmica porque a provedora de filmes e séries via streaming anunciou que não lançaria o filme nos cinemas, nem na França. A organização do festival alvoroçou-se – como um concorrente à Palma de Ouro não iria para os cinemas? Houve réplica e tréplica. Em agosto, foi a vez de o Festival de Gramado ceder à modernidade e também programar outro filme cuja existência, além do festival, seria via streaming. O Matador terminou vencendo alguns prêmios Kikito. Desde a sexta, 10, o longa de Marcelo Galvão está disponível on demand.

O diretor é figurinha carimbada no festival da serra gaúcha, onde já venceu os Kikitos de melhor filme, com Colegas, em 2012, e o de direção, justamente, com A Despedida, em 2015. Nenhum dos dois é uma unanimidade. Colegas é sobre um grupo de portadores da síndrome de Down que caem na estrada. O diferencial é a condição dos protagonistas. Fora isso, e já é muito, há que reconhecer, o filme não tem nada de especial. A Despedida marcou um upgrade. Juliana Paes – ela! – é a amante jovem e fogosa do velho Almirante. Diante da sua deusa, o alquebrado Nelson Xavier não se intimida. Diz a frase de gênio – “Enquanto tiver língua e dedo, a batalha (do sexo) estará ganha ”

Marcelo Galvão ama o cinema popular, e seus filmes dão conta disso. Na coletiva de O Matador, ele confessou – “Cresci vendo bangue-bangue spaghetti, daqueles bem bons italianos, com meu avô e sempre quis fazer alguma coisa naquela linha, com muita ação. Não sei se a gente pode falar em heroísmo, porque existem diversos tipos de heróis na trama, e alguns até desaparecem cedo.”

O Matador conta a história de Cabeleira, interpretado por Diogo Morgado. Assassino temido no interior de Pernambuco, ele foi criado pelo cangaceiro Sete Orelhas, que o encontrou, abandonado, ainda bebê. O início, muito estilizado, mostra justamente a onça ameaçando o bebê e Sete Orelhas que intervém, para salvá-lo. Passam-se os anos e Cabeleira, adulto, procura o desaparecido Sete Orelhas. Sua busca o leva à cidadezinha controlada a ferro e fogo pelo cruel Monsieur Blanchard. O choque é inevitável.

O Matador rachou o público na noite de abertura de Gramado. Foi exibido, em competição, logo após João, o Maestro, fora de concurso. O longa de Mauro Lima sobre o maestro João Carlos Martins é muito bem produzido, e até bem feito. Dá tratamento sóbrio à história de um obcecado por sexo. Coincidência ou não, tem muito sexo e violência em O Matador, mas o tratamento agora é propositalmente “sujo”, não no sentido moral, mas no estético. Isso valeu não poucas acusações a Galvão. Foi chamado de “sádico”. Qualquer pessoa que se disponha a analisar criticamente os bons westerns italianos – os dos três Sergios: Leone, Sollima e Corbucci – há de concordar que eles subvertiam os códigos de Hollywood justamente por serem cruéis. Hollywood, através de Henry Hathaway, terminou por assimilar essa crueldade, especialmente em Nevada Smith, com Steve McQueen. E hoje temos Quentin Tarantino. Se O Matador é sádico, o que serão Django e Os Oito Odiados? Altruístas é que não, com certeza.

Cabeleira, tal como é criado por Diogo Morgado, divide-se entre a brutalidade e a ternura. Para o diretor, O Matador é a história de um ogro (Sete Orelhas) que se humaniza em contato com a criança. Mais tarde, e com Cabeleira, essa história de certa forma vai se repetir. “Talvez esteja aí o traço de heroísmo mais claro dessa história”, admite Galvão. O Matador terminou ganhando em Gramado os Kikitos de fotografia (Fabrício Tadeu) e trilha musical (Ed Côrtes). Do elenco participa a atriz (e diretora) portuguesa Maria de Medeiros. Galvão a conheceu, ofereceu o papel e a estrela de Tarantino e Manoel de Oliveira não só aceitou como disse que sempre quis fazer uma personagem como a que interpreta aqui.

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