A história da Igreja Matriz de São Sebastião de Limeira, SP, se cruza com a do próprio bairro da Boa Vista, onde está localizada. Até o início da década de 1840, a concentração populacional e urbana da então freguesia estava localizada próxima à capela de Nossa Senhora das Dores. Tal situação altera-se, em partes, com a construção de uma capela dedicada à Santa Cruz no ano de 1842 na margem oposta do Ribeirão Tatu. Junto dela foi erigido também um cemitério, que levou o mesmo nome, bento e aberto em 1845. Neste período, o único espaço de enterramentos em Limeira era dentro e no pátio fronteiro à primitiva capela, apesar de normativas imperais que já restringiam os enterros chamados ad sanctus, isto é, dentro dos templos (dentre elas, a lei de estruturação dos municípios de 1828).
Com a construção deste novo cemitério, foram emitidas leis pela Câmara (instalada oficialmente em 1844) que previam penalidades e multas a quem desobedecesse a proibição de enterros na matriz. Mesmo tendo sido construído com a ideia de ser “público”, havia uma postura excludente com relação às outras profissões religiosas, haja vista que o catolicismo era a religião oficial do Império. Assim, os primeiros enterros de protestantes, por exemplo, inicialmente ocorreram em uma área aberta ao lado do Cemitério da Santa Cruz e somente na década de 1860 é que eles organizaram para si um espaço no bairro dos Pires. Uma rua foi aberta entre este cemitério e a Matriz, ficando conhecida por Rua Santa Cruz, nome que carrega até os dias atuais. Este cemitério (e todos os demais existentes em Limeira) foi fechado em 1892, quando o poder público local inaugurou um outro espaço de enterramentos, agora público e desvinculado de profissão religiosa: o atual Cemitério da Saudade.
A região onde tudo isso ocorreu era de mata virgem e já conhecida com a alcunha de “Boa Vista”. Como apontou Busch, “a Boa Vista situava-se em boa parte dentro da área de meia légua na quadra que o Cap. Cunha Bastos doara por escritura pública, em 26-2-1832, à Freguesia de N. S. das Dores” (A VOZ DA BOA VISTA, 1967). Ao longo dos anos, este terreno começou a ser repartido em fazendas, sítios e chácaras, recebendo casas e estabelecimentos comerciais – levando o povoamento da Vila, depois cidade, para além do leito do Ribeirão Tatu.
Do ponto de vista da administração religiosa este crescimento começou a ser sentido, trazendo diversos problemas pastorais – especialmente ao longo das primeiras décadas do século XX. Até então, Limeira possuía uma única paróquia e cabia a seu pároco atender tanto as demandas da igreja matriz, quanto das dezenas de capelas que ficavam próximas ou não ao centro urbano. Uma delas era a de Santa Cruz, cujas festas eram celebradas em 3 de maio. Frente a isso, já em meados da década de 1930, durante o paroquiato do Padre Miguel Andery, começou-se uma discussão acerca da implantação de uma nova paróquia em Limeira.
Após os estudos por parte da então Diocese de Campinas, a quem Limeira estava submetida, e com o apoio do Padre Andery, uma nova paróquia foi criada no dia 18 de janeiro de 1939, tendo como patrono São Sebastião. A área de cuidado pastoral era extensa, seguindo a divisão pelo leito da estrada de ferro da Companhia Paulista, chegando aos limites administrativos de Limeira (compreendendo, na época, os bairros da Boa Vista e Vila Camargo) com Campinas, Mogi-Mirim e Araras e, eclesiásticos, com a Paróquia Nossa Senhora da Assunção de Cascalho. A escolha do padroeiro, o mártir romano Sebastião, nascido em Narbonne, França, em 256 e morto por ordem do imperador romano Diocleciano em 286 em Roma, Itália, não está documentada, mas se acredita que tenha sido por conta da intensa devoção que os fiéis locais tinham para com o santo guerreiro, protetor contra a peste e os males.
Tendo em vista a inexistência de um outro espaço naquela circunscrição geográfica, a capela de Santa Cruz foi escolhida para sediar a paróquia até que um outro templo fosse construído, recebendo os direitos eclesiásticos de uma igreja matriz. No mesmo dia da criação da paróquia, a pedido do Padre Andery, o Bispo diocesano Dom Francisco de Campos Barreto expediu outra provisão nomeando uma comissão para arrecadar recursos e conduzir as obras de construção da nova matriz da Paróquia São Sebastião, tendo como presidente o próprio padre e o Major José Levy Sobrinho, na época prefeito municipal, além de diversos outros nomes de moradores, principalmente dos bairros da Boa Vista e Vila Camargo.
Apesar da criação ter ocorrido em 1939, a instalação oficial só ocorreu no dia 26 de janeiro de 1941, às 9h, haja vista a falta de padres na Diocese de Campinas para ocupar a sua direção pastoral. A celebração litúrgica de instalação foi solenemente conduzida pelo Padre Miguel Andery a pedido de Dom Francisco de Campos Barreto (2º LIVRO TOMBO DA PARÓQUIA NOSSA SENHORA DAS DORES, 1941, p 86 e 86v). Na ocasião, tomou posse como primeiro pároco o Padre Milton Santana (1907-1998), natural de São Felix, Bahia, e ordenado em Campinas. Anteriormente, ocupava a posição de pároco em Jaguariúna. Em 9 de fevereiro deste mesmo ano foi abençoada a imagem do padroeiro, doada por Amelia Santana, mãe do Padre Santana, em cerimônia iniciada na matriz Nossa Senhora das Dores, seguida de procissão até a Capela de Santa Cruz, matriz provisória da nova paróquia (GAZETA DE LIMEIRA, 9 fev 1941).
Após a instalação, as ações em prol das obras da matriz se intensificaram, seja com os festejos realizados (em especial durante as festas do padroeiro), ou com outras ações e donativos. Isso tudo acompanhado de um intenso movimento pastoral promovido pelo Padre Milton Santana. Umas das principais ações do sacerdote foi a organização de diversas organizações leigas, como a Liga da Doutrina Cristã e Liga do Menino Jesus, em fevereiro de 1941, e a Pia União das Filhas de Maria e a Congregação Mariana, instaladas em 16 de março deste ano, seguidas do Apostolado da Oração, Liga de São José, entre outros grupos religiosos masculinos, femininos e/ou mistos. Em junho do mesmo ano, iniciaram-se os debates acerca da instalação de um círculo operário, o qual se organizou e, em 1945, contava com cerca de 2000 sócios e mantinha farmácia, ambulatório, gabinete dentário, aulas de corte e costura e alfabetização (GAZETA DE LIMEIRA, 26 ago 1945).
A pedra fundamental da igreja de São Sebastião foi lançada no dia 31 de agosto de 1941 em um terreno localizado entre a Vila Camargo e a Boa Vista, próximo ao leito da Estrada de Ferro Paulista. A cerimônia litúrgica iniciou-se às 7h, sendo a parte musical a cargo do conjunto orquestral “Cristo Rei”, sob regência de Antônio Venâncio (GAZETA DE LIMEIRA, 4 set 1941), grupo que já se apresentava na Capela Santa Cruz. A deposição da pedra fundamental, que recebeu documentação de época em uma urna especialmente preparada, contou com discursos de José Marciliano da Costa Júnior, do próprio Padre Milton Santana, do Sargento Artur Pinto Sobrinho, da Sra. Nair Santana Moscoso e outros oradores (GAZETA DE LIMEIRA, 4 set 1941). Ao longo das obras, iniciadas somente em dezembro de 1942, o patrimônio sacro do templo ia crescendo graças às doações, como as das imagens de São José (oferecida por José Perdão) e Santa Terezinha do Menino Jesus (oferta de Fortunato de Luca e sua esposa), ambas em novembro de 1941.
Coral Cristo Rei na Festa de São Sebastião, realizada na Capela de Santa Cruz. Limeira, SP. 20 jan 1942. Acervo Museu Eclesiástico da Diocese de Limeira.
Após cerca de dois anos de construção ininterruptos, a nova igreja de São Sebastião foi inaugurada no dia 26 de agosto de 1945, embora o templo já servisse ao culto público desde dezembro de 1943. A celebração foi oficiada pelo Monsenhor João Alexandre Loschi, em nome do bispo diocesano de Campinas.
Projeto Arquitetônico
O templo seguiu as linhas neorromânicas de matriz italiana – tipologia muito utilizada nas igrejas do Estado de São Paulo da primeira metade do século XX, junto do estilo neogótico. A configuração arquitetônica é em planta retangular, com torre sineira central, modelo de composição já muito utilizado no mundo paulista desde o século XIX. A autoria do projeto coube ao engenheiro Rogério Vieira Tucci, da cidade de Mogi Mirim, sendo o mesmo publicado no periódico O Limeirense junto a uma poesia de agosto de 1943 de autoria José Marciliano da Costa Junior (O LIMEIRENSE, 31 out 1943).
A obra é realizada em alvenaria de tijolos e revestida em argamassa. Esta forma modenaturas e elementos clássicos, o que denota a recepção e assimilação, por parte de Tucci, de modelos construtivos de matriz italiana. Destacam-se as presenças dos arcos plenos ou de volta perfeita, seja no interior ou no exterior do templo, o que denota a matriz românica, estilo arquitetônico e estético que prevaleceu no mundo medieval entre os séculos XI e XIII. Ainda na fachada, veem-se arcaturas (ou arcos cegos) lombardas abaixo da área da cornija, bem como a grande rosácea acima da portada principal. Outro ponto importante é que, no momento de sua construção, a igreja com sua torre sineira marcava a paisagem da Boa Vista, constituindo-se como polo de referência visual de Limeira, da mesma forma que a Matriz de Nossa Senhora das Dores o era para a outra porção da cidade além do Ribeirão Tatu.
Ao longo dos anos diversas obras foram realizadas no templo, porém mantendo suas linhas principais. A partir de então, a paróquia contou com intensa participação e colaboração da comunidade local e dos padres que foram nomeados para exercerem seus ministérios sacerdotais à frente dessa igreja de relevante importância para o município de Limeira.
Texto e pesquisa
Jeison Lopes (Comissão de Bens Culturais – Diocese de Limeira)
João Paulo Berto (Comissão de Bens Culturais – Diocese de Limeira)
Marco Antônio Erbeta (Assessoria de Imprensa – Diocese de Limeira)