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Homenagem: muito obrigado, meu amigo João Valdir de Moraes

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Vou dedicar a coluna de hoje a quem nos deixou durante a semana: João Valdir de Moraes. Eu escolhi o domingo para escrever sobre ele, pois é o dia que todos estão em casa e com tempo de ler, não naquela correria desenfreada do dia a dia.

Talvez de todos os amigos que eu tenha feito nesta vida, o João Valdir tenha sido o mais generoso. E olha que, analisando friamente, eu não merecesse tanto carinho por parte dele. Vou explicar e confessar, pois estou com tempo.

Eu acho que eu brinquei exageradamente com o João Valdir. Poderia ter levado mais a sério algumas situações. Mas eu entendo meu lado. Ele era engraçado demais em tudo. Suas histórias do passado que contava, como da cobra, do nunchaku (né Fernandão Carvalho?), do seu avô que era toureiro, enfim. Você olhava para ele, dava vontade de rir.

Eu pegava no pé do João Valdir o tempo todo. Isso eu me arrependo e muito. Mas o tempo não volta. Eu exigia demais dele, mas esqueci que ele era muito mais velho do que eu (23 anos a mais) e que não tinha o mesmo pique que o até então novato aqui tinha. Ele queria viver e curtir. Eu queria audiência e resultados.

Um dia meu pai chamou a minha atenção. “Didi, deixa o João Valdir em paz. Não exija tanto dele assim. Cada um é de um jeito. Ele é de um tempo diferente do seu. Hoje é tudo mais rápido. A tecnologia está aí. É difícil a gente se enquadrar. O Joãozinho gosta de você”. E a Voz Metálica tinha razão.

Eu pegava no pé do João porque ele dava notícias atrasadas como manchete. Brigava com o João quando ele viajava comigo e quando chegava no campo ele perguntava com quem a Inter ou o Independente iria jogar. Nossa, eu ficava maluco. Como assim? Ele não estudava o jogo. Não ia preparado para nada. Nem parecia que iria reportar o jogo.

Mas quando ligava seu microfone, tirava de letra. Usava toda a sua experiência para brilhar. Às vezes soltava suas pérolas. Em um jogo do Independente disse que o esquema tático do Álvaro Gaia era o “3-4-4-2”. Como assim, João? Tem dois a mais no time. Não é telefone.

Sem contar que um dia ele falou desse jeito para o Tatinha Casagrande na cabine do Pradão: “Eu sou um comentarista que vejo o jogo todo. Você só vê onde a bola está”. Naldo Dias emendou: “Umas coisaaaaaaas”.

E quando ele vinha imprimir 50 folhas de sulfite na Gazeta de Limeira para ler apenas duas notícias. Eu falava assim: “João anote e interprete a notícia”. Ele respondia: “Cuida da sua vida, Ferreira”.

E assim a gente ia convivendo. Eu brigava com o João Valdir todo santo dia e 15 minutos depois estava almoçando com ele no Ki Lanchão, né Eliana Japa?

Nossas viagens para Curitiba com o Dr Roberto Lucato eram prazerosas demais. O João Valdir contava cada história. E ao som de Benito de Paula a viagem de oito horas parecia que tinha durado apenas uma. Sem contar aqueles CDs de piadas sem graças que ele gostava de levar.

Dividi o quarto com o João Valdir inúmeras vezes. Eu passava de cueca ou às vezes até pelado perto dele, coisa natural até pela convivência de vários anos, e já vinha ele falando: “Ferreira, até que você tem uma bundinha bonita”. Estou rindo alto aqui escrevendo sobre isso.

A gente gostava de sair depois dos jogos. Não me pergunte onde íamos, mas íamos. Não falhava uma vez. Se alguém perguntasse o nome dele, na hora soltava: “Prazer, sou o Eduardo”, kkk.

Minha primeira narração de basquete foi com ele e com o Flávio de Carvalho. Era engraçado ver um repórter de 1m58 entrevistando por exemplo, o pivô Márcio Turcão de 2m10. Às vezes ele subia no banquinho.

Teve uma vez, no Pacaembu, que João Valdir simplesmente confundiu o Compadre Washington com o Beto Jamaica, do “É o Tchan”. Imediatamente, Washington soltou: “Ichiiiiii, você é do Brasil?”.

Sem contar a semelhança com Solimões. Um dia desses, almoçando no Frango Assado, uma atendente não tirava os olhos dele. Na hora eu saquei. Fui até o João Valdir, bati nas costas dele e disse: “Bora Solimões, senão perderemos o show”. Nossa, a funcionária teve um chilique. Disse que era fã de carteirinha. Tirou foto, abraçou e pediu um autógrafo. João Valdir levou na brincadeira e atendeu os pedidos.

Já Denis Suidedos o apelidou de Brocador. E não é que João Valdir gostava de ser chamado disso. Ele batia no peito e falava para todos: “um palmo e dois dedos”.

No velório do Joãozinho, César Roberto lembrou de algumas manias do já saudoso repórter: tirar caspa nos ombros. Vivia balançando suas camisas. Era um sarro.

Chato mesmo era quando ele se juntava com Mário Roberto, vulgo Lemão da Gazeta. Pensa em dois fofoqueiros de primeira. Em 15 minutos, eles falavam da vida de 100 pessoas, inclusive a minha. Era “boca de lata” pra cá, “boca de lata”, pra lá, E assim a carruagem seguia.

Até o nome da nossa diagramadora de esportes Patrícia Soares ele confundia. “Tudo bem por aí, Priscila?”. kkkkk. E toda vez falava: “que pele macia”. Joãozinho era vaidoso. Pintava o cabelo (a gente falava que era com tinta Nugget), fazia tratamento de pele e as unhas regularmente. Tinha sempre a impecável base.

A repórter Renata Reis adorava receber um beijo dele na redação.
Quando eu pegava muito no pé dele, ele falava: “Tem um milhão de pessoas ao nosso redor e você me escolheu para me apurrinhar. Me erra Ferreira”. Eu ria muito.

Suas matérias na Segunda Esportiva eram imbatíveis. Carrinho de rolimã, passeio de cavalo, artes marciais e até saindo quase pelado de uma sauna.
Foi aí que surgiu a ideia da toalha João Valdir de Morais, “corpo molhado, nunca mais”. A gente brincava que ele parecia aquele personagem do reclame do cotonete.

Ele ficava bravo também quando a gente o chamava de “homem das cavernas”. Isso porque, vivia cheio de casquinhas de ferida nos joelhos e cotovelos. Ele ficava puto quando tocava nesse assunto.

Um de seus melhores amigos era o empresário Roberto Martins. Um dia presencie uma cena na Segunda Esportiva. O Luxa estava com um relógio importado da Ferrari. Valia uma nota. Joãozinho na hora disse: “Nossa, que máquina no seu pulso”. Na hora, Roberto Martins tirou do braço e lhe deu.

João agradeceu e em seguida soltou: “Roberto Martins, seu carro é lindo também”..kkkkkk

Tenho muita gratidão pelo João Valdir, afinal de contas, foi quem me deu aquele empurrão para que eu saísse do plantão esportivo para me tornar um narrador de futebol.

Me lembro como se fosse hoje. Em 10/03/2001. Inter x Corinthians no Limeirão. Paulistão comendo solto. Aniversário de três anos da minha filha e uma super festa em Rio Claro.

Como o Corinthians é meu segundo time – depois do Vascão é claro -, pedi dispensa da rádio para ir assistir o jogo. Avisei a mãe da minha filha que não iria na festa. Parece que o destino estava escrito para mim.

Neste dia, o narrador Pedro Elizeu não foi avisado que narraria o jogo. Às 15h45, ou seja, 15 minutos antes do início, João Valdir e Naldo Dias se reuniram rapidamente na cabine número 7. Em seguida, João Valdir, pegou o microfone poderoso da Rádio Educadora e colocou em minhas mãos. Ele simplesmente me disse: “Quebra essa, Ferreira. Realiza seu sonho. Narra o jogo. Nós te daremos toda a retaguarda possível. Confiamos em você e no DNA do seu pai”.

Toda vez que falo ou escrevo sobre isso, eu choro. Peguei aquele microfone como se fosse um presente. Tinha 26 anos. Me concentrei e o que me ajudou era que eu conhecia os dois times. Mesmo tremendo de medo e com um frio na barriga, narrei.

E o mais surpreendente é que minha narração foi aprovada. Passei de plantão a narrador e nunca mais parei. Se não fosse por esse gesto nobre do João Valdir, talvez minha história no rádio limeirense pudesse ter tomado outro caminho.

Pouco antes dele morrer, levei o João Valdir no Pimba nos Esportes. Perguntei para ele porque dessa decisão de me colocar para narrar, sem ter nenhuma experiência. Com aquela humildade que Deus lhe deu, ele respondeu: “Tava na cara que você seguiria os passos do seu pai. Desde pequeno eu via isso em você. Era questão de oportunidade. E ela veio na melhor hora”.

Sem contar que ele me ensinou a montar os equipamentos de transmissão. Foi um dia na Rua Javari. Disse a ele: hoje eu aprendo, nem que for na marra. Ele teve muita paciência comigo.

Uma coisa eu lamentei: pouca gente no velório e em sua despedida. Pela grandeza do pequeno notável, muita gente deixou de ir. E olha que ele enalteceu milhares de limeirenses, seja com suas famosas Janelas do João da Gazeta de Limeira ou com suas entrevistas no A Hora da Notícia.

João Valdir, meu amigo, irmão e pai, se eu tivesse a oportunidade de te ver pela última vez, com certeza te falaria um “muito obrigado por confiar tanto assim em mim”. Também te pediria desculpas pelos meus exageros. Deus te receba de braços abertos.

Faça a alegria de todos aí no céu e transmita um abração no Pitbull Naldo Dias e no eterno comentarista João Ferraz. Apesar de ser pequeno, você foi um gigante em Limeira. Você jamais será esquecido, pode ter certeza disso.

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