Um dos seis faz uma piada, todos riem e ouvem o barulho do clique da câmera fotográfica. “Puts, ninguém vai acreditar que a gente estava rindo de verdade”, diz Juliano Enrico, um dos integrantes da TV Quase, esse grupo que produz o Choque de Cultura, um programa humorístico que ganhou o YouTube e ultrapassou a barreira de 1 milhão de visualizações, lançado semanalmente, sempre às quintas-feiras, no canal da plataforma de vídeos mantido pelo site de cultura pop Omelete. Os rapazes divertem-se com o novo comentário, se desconcentram e esquecem da fotógrafa ali por um breve instante. Mais um clique. Mais risos.
Não que rir seja um problema para Juliano, também criador da animação Irmão do Jorel, para os atores e roteiristas Caito Mainier, Daniel Furlan, Leandro Ramos e Raul Chequer, ou para o diretor Fernando Fraiha. O difícil, na verdade, é não rir, mesmo quando o assunto é sério. Na mesma sessão de fotos para o Estado, na tarde de quinta, 8, sugeriram colocar um banco em dois degraus e sentar nele tortos, mesmo. “Vamos deixar desconstruído”, diz Raul Chequer, o intérprete de Maurílio, um dos motoristas que estrelam o programa – o mais “entendido” de cinema dos quatro na ficção. Encerradas as fotos, ele diz: “Por favor, escolha a pior das fotos, ok?”.
Já numa sala quadrada, com uma mesa no centro e pôsteres de filmes na parede, para a entrevista, eles param diante do cartaz do filme Eu Fico Loko, de Christian Figueiredo. “Quando você não sabe quem é (no cartaz), é porque é cultura jovem”, brinca Mainier, o intérprete do apresentador do Choque de Cultura Rogerinho do Ingá – embora seja difícil saber se a frase veio do ator ou do personagem. “Você sabe que o raciocínio do fumante é complicado, né?”, diz ele, sobre os integrantes que fumavam um cigarro entre as fotos e o papo. De novo, discernir entre criador e criatura é difícil.
Possivelmente, aí esteja o segredo do Choque de Cultura, ao entregar absurdos, com frases de efeito que transitam entre o surrealismo e o “já conheci um sujeito assim”. “Tá vendo isso? É tudo computador”, diz o personagem Julinho da Van, de Ramos, ao comentar o filme Animais Fantásticos e Onde Habitam. Embora o comentário faça sentido – afinal, blockbusters são recheados de efeitos visuais, mesmo -, encrencar com isso, em 2018, é surreal
O sucesso é tamanho que, no Rio de Janeiro, será realizada a primeira edição do Bloco dos Amantes da Sétima Arte, uma expressão dita pelo personagem Maurílio (de Chequer), no dia 17 de fevereiro. Até o fechamento desta edição, 5 mil pessoas já haviam confirmado presença no evento do Facebook. E, mais curioso, o bloco não é oficial. “Estaremos aqui, trabalhando”, explica Daniel Furlan, o Renan do Choque.
Embora sejam personagens criados, os quatro motoristas absurdo têm raízes no real. Mainier, de fato, pegava a rota de van de Charitas, em Niterói, até a Gávea. O estilo “palestrinha” sabichão de Maurílio vem do irmão do ator. A forma doce de falar de Renan foi inspirada num vendedor de mate, no Rio, e Julinho da Van, garante Ramos, é praticamente uma cópia do pai do intérprete. “O melhor comentário que já li nos vídeos era: ‘Claramente são atores’”, diz Ramos.
Na era das redes sociais nos quais os memes – aquelas figuras, fotos e frases – ganham proporções gigantescas, de compartilhamento em compartilhamento, o Choque de Cultura é um prato cheio. Máximas de efeito são ditas aos montes pelo grupo que passou a trabalhar junto em 2012, em outros projetos e parcerias, de Larica Total (do Canal Brasil), passando por MTV (Rockgol) e humorísticos do YouTube, como O Último Programa do Mundo, Falha de Cobertura e Overdose. “O segredo para um programa dar certo”, diz Chequer, “é fazer vários outros errados”, encerra ele, ou seria Maurílio?
Imagem: Reprodução Youtube